Wednesday, May 03, 2006

Máfia russa quer a Varig

Ademar de Barros, governador de São Paulo, recebeu do general Amauri Kruel, comandante do II Exército, em 5 de junho de 1966, a notícia de que o general Castelo Branco havia assinado a cassação de seu mandato e a suspensão de seus direitos políticos, sendo substituído pelo vice Laudo Natel.
No Palácio do Morumbi, a confusão foi total. Ninguém sabia o que o derrubado governador, apoiado por sua poderosa Polícia Militar, ia fazer.

Ademar convocou imediatamente uma reunião de todo o secretariado e dos diretores dos órgãos mais importantes do governo, chamou os amigos mais próximos e todos foram se encaminhando para o salão de despachos.


ADEMAR

Corria um frio suor coletivo. Ademar iria acatar ou reagir? E reagir como? Ademar chegou, foi para a cabeceira da mesa, sentou-se, calado, o rosto tenso, o olhar duro, esperou que todos se sentassem. Olhou para um lado, olhou para o outro, conferiu um por um, fitando cada um nos olhos:

-Meus amigos, agradeço comovido a solidariedade de vocês. Vocês sabem que o Castelo me cassou. Um ingrato. Só está lá na presidência da República porque garanti a revolução de 31 de março aqui em São Paulo. Vocês são meus amigos e eu conto com o apoio de vocês. Respondam com toda a franqueza. Da resposta de vocês vai depender o destino da minha vida.
Ademar parou, respirou fundo. Havia um silêncio de punhal. Continuou:
- Me digam. De que é que eu vou embora? De avião ou de navio?
Foi de avião, dois dias depois, 7 de junho. E de peruca marrom.


BEREZOVSKI

Também em São Paulo, na semana passada, aconteceu outra história ridícula como a fuga de Ademar. De repente, apareceu a notícia de que estava escondido na cidade o bilionário da máfia russa, Boris Berezovski, dono do time inglês Chelsea, de um time na Geórgia e do fundo de investimentos MSI, que arrendou o Corinthians através de seu testa-de-ferro, o irianiano Kia.
Berezovski é um fugitivo internacional. Condenado a mais de 20 anos de prisão na Rússia, sua terra, por um mensalão generalizado e golpes financeiros contra o país, procurado pela Suíça, pela França e outras praças, negociou com Tony Blair um asilo na Inglaterra, em troca de milhões de dólares para as campanhas eleitorais do primeiro-ministro inglês, seu protetor.
Mas não pode sair da Inglaterra, nem a passeio, porque a Interpol está em cima para cumprir ordens de prisão contra ele, partidas de vários países.


CORINTHIANS

Os processos contra Berezovski são os mais diversos. Com a implosão da União Soviética, ele se aliou a Yeltsin, passou a controlar a maior empresa de petróleo do país, empresas de gás e a companhia de aviação Aeroflot. Explodiu todas, fugiu e saiu da Rússia com mais de 20 bilhões de dólares.
Em Londres, montou seu novo bunker de negócios, inclusive, para lavar dinheiro, a propriedade ou participação em times de futebol na Inglaterra, na Geórgia, em Portugal e, afinal, no Brasil, arrendando o Corinthians.
Há dois anos, quando ele começou a negociar o Corinthians através do iraniano Kia, fui o primeiro a denunciar, aqui, quem era ele, o que havia feito na Rússia, suas condenações e esconderijo na Inglaterra. Quando sai da Inglaterra, Berezovski costuma usar o nome falso de Platon Yelenin. Confirmou-se tudo. Os procuradores José Reinaldo Guimarães e Roberto Porto, do Ministério Público de São Paulo, abriram processos sobre a origem do dinheiro sujo do mafioso russo e do iraniano "neocorintiano" Kia.


TUMA

Na semana passada, afinal, o fantasma da máfia russa desceu em São Paulo, em um jatinho, com uma comitiva de dez pessoas e foram para o hotel cinco estrelas Unique, onde ocuparam os melhores oito apartamentos.
O deputado Romeu Tuma Junior (PMDB de São Paulo), ex-diretor da Interpol no Brasil, denunciou e pediu ajuda à Polícia Federal, à Polícia Civil e à Polícia Militar de São Paulo, que mandou três viaturas para a frente do hotel.
O empresário Renato Duprat, braço direito de Berezovski e de Kia no Brasil, disse que ele veio ao Brasil tentar comprar a Varig. Entrou no País com autorização do Itamaraty, depois de consultar o governo brasileiro.
Mas, como todo mafioso tem sempre seus informantes de orelha em pé, ao saber que já havia três viaturas da Polícia Militar de São Paulo na porta do Hotel Unique, Berezovski e sua comitiva nem mais voltaram ao hotel, para arrumar as malas, fazer o "check-out" para a saída e pagar a conta. Às carreiras, foram para o aeroporto, pegaram o jatinho e sumiram.


DIRCEU

O que se diz em São Paulo é que um mafioso de mais de 20 bilhões de dólares não iria arriscar a pele numa aventura, sem antes ter bem negociado tudo com o governo brasileiro através de poderosos intermediários.
A viagem ao Brasil teria sido montada há dias pelo agora "vitorioso empresário" José Dirceu, em uma de suas viagens à Venezuela. A imprensa publicou que Lula pediu ao presidente Hugo Chávez ajuda para encontrar uma saída para a moribunda Varig. O caminho aberto por Dirceu em Caracas foi dinheiro da máfia russa para a Varig e para a campanha de Lula e do PT.

SEBASTIÃO NERY

(Tribuna da Imprensa, www.tribunadaimprensa.com.br, 03/05/2006)